terça-feira, 25 de agosto de 2009

Nostalgia
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PROJETO PADRON
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PIONEIRISMO NA RENOVAÇÃO
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EM ÔNIBUS URBANOS

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Antonio Ferro


Projeto que estabeleceu pioneiras normas construtivas para ônibus urbanos foi um grande avanço para impedir a deterioração do principal meio de locomoção coletiva em nosso país. (Em tempos de grande planejamento para os preparativos da Copa de 2014, nada mais salutar que rever esse conceito).

A década de 70 estava às favas e o transporte urbano de passageiros realizado por ônibus não apresentava qualquer tipo de melhoria que pudesse proporcionar aos seus usuários um pouco de comodidade em toda a operação. O pragmatismo era a aplicação de um produto sem uma definição regulamentada. Isso pôde ser comprovado por um grande número de encarroçadoras que, estimuladas pela omissão das forças da lei, impulsionaram o mercado com produtos improvisados. Exemplo de um país que ainda não seguia a trajetória fundamentada por princípios normativos em sua evolução.

Uma combinação não muito proveitosa da capacidade de nossa indústria imperava no setor de ônibus urbanos. Os tipos de veículos encontrados eram baseados em chassis com motor dianteiro (não muito diferente de hoje) e carroçarias que não privilegiavam nem um pouco o conforto dos passageiros, com muito ruído, falta de ventilação/iluminação e pouco espaço interno para a acomodação de quem necessitava usá-las. Das três montadoras presentes em nosso mercado naquela época, todas concentravam suas atenções em chassis, sendo que uma marca oferecia um modelo diferencial. A Mercedes Benz há tempos produzia os seus chassis para encarroçamento, além de um veículo integral (união entre carroçaria e chassi), fato marcante desde o início de sua presença no Brasil. Já a Scania, sua linha de ônibus era composta por chassis com motor dianteiro, comuns desde o seu princípio brasileiro em 1957, e o modelo dotado com bloco na traseira, equipamento encontrado a partir dos anos de 1970 (aqui ainda voltado para o segmento rodoviário). A Volvo era a caçula, trazendo uma inovação com características próprias para o transporte urbano de passageiros – um chassi com motor localizado no entre eixos e suspensão pneumática.



Inspiração européia para o modelo Padron.

Foto - arquivo Daimler

Mas antes precisamos dar um pulo até meados dos anos de 1960, mais exatamente na Alemanha Ocidental, assim chamada em tempos de “Guerra Fria”. A VOV (Verband Offentlicher Verkehrsbetriebe ou para simplificar, Associação das Companhias de Transporte Público daquele país) em comum acordo entre as fabricantes locais de ônibus e o governo alemão, estabeleceu normas para a padronização da construção de um ônibus urbano. O projeto básico deveria seguir uma série de regras que norteavam a produção dos veículos exigindo qualidade e especificações ideais no emprego de materiais adequados para se conseguir segurança e conforto aos usuários e motoristas. Dentre os principais parâmetros definidos, o ônibus padrão VOV tinha 11m de comprimento com layout interno para acomodar 105 ou 115 passageiros; altura do piso do salão de passageiros 740 mm acima do solo, sendo que o primeiro degrau das portas deveria ficar distante 340 mm; suspensão pneumática integral composta por válvulas de nível; estrutura, chapeamento e acabamento com vida útil mínima de 10 anos; motor traseiro com potência de 200 CV DIN. Com as regras em prática, os principais nomes da indústria alemã de ônibus logo apresentaram seus modelos de acordo com o especificado.

Volvo - Originalidade com seus primeiros chassis no Brasil.
Foto - Arquivo Volvo

O cenário nada encorajador no transporte urbano sobre pneus que perdurava em 1977, fez o então GEIPOT – Empresa Brasileira de Planejamento de Transporte – órgão do Governo Federal, em convênio firmado com a Secretaria de Planejamento da Presidência da República e com o Ministério dos Transportes (através da EBTU – Empresa Brasileira de Transportes Urbanos), a apresentar um projeto denominado Padron – conjunto de estudos para promover normas técnicas na construção de um ônibus urbano. A primeira etapa desse trabalho envolveu uma pesquisa de campo realizada um ano antes nos principais centros urbanos brasileiros. A constatação apresentada era que os serviços de ônibus estavam em baixa, com uma qualidade aquém do necessário para o transporte de massa. Os itens analisados foram: confiabilidade, conforto, consumo de combustível, segurança e tempo de viagens, além das características de construção dos veículos.


A intenção era melhorar o conforto ao passageiro.
Arquivo Volvo

Alguns anos antes, Curitiba já se destacava entre as principais cidades brasileiras enfatizando um sistema de transporte com tratamento diferenciado ao ônibus, com suas famosas canaletas exclusivas que promoveram eficiência aos serviços, trazendo ainda um novo conceito em ônibus urbano. Seguindo especificações próprias, determinadas pelo IPPUC – Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba – o veículo pioneiro a rodar pelas vias exclusivas, chamado de Veneza Expresso e produzido pela gaúcha Marcopolo, anteviu algumas das normas que seriam colocadas pelo projeto Padron, como a localização do motor, na área traseira e a facilidade encontrada no embarque e desembarque dos passageiros, provocada pelas largas portas.

Após reunir todos os dados pesquisados, o GEIPOT tratou de dar um andamento ao projeto, contando com a participação da indústria, através da Fabus – então Associação Nacional dos Fabricantes de Carrocerias para Ônibus – e das próprias montadoras de chassis. Dúvidas iniciais quanto ao desenvolvimento das novas normas surgiram, mas nada que não pudessem ser respondidas. Com o rápido crescimento das regiões metropolitanas, a idéia era readequar o setor de ônibus urbano, que se encontrava em estado crítico. Com isso, dois relatórios foram apresentados: a Etapa I, contendo as especificações para a construção das carroçarias, e a Etapa II, com as definições técnicas para os chassis. A documentação final foi entregue para a indústria de ônibus em 1979, composta por um memorial descritivo fundamentado em normas semelhantes encontradas no continente europeu.

O resultado pôde ser visto no ano seguinte, com o surgimento de uma nova geração de ônibus urbanos. No total foram construídos 5 protótipos para um laboratório de campo em 6 principais capitais brasileiras, que operaram sob diversas condições de clima, topografia e trânsito. As parcerias Mercedes Benz / Caio e Marcopolo, Scania / Ciferal e Volvo / Caio e Marcopolo desenvolveram os veículos dentro das orientações do projeto. Entre as características técnicas elaboradas pelas especificações e implantadas nos novos ônibus, destacavam-se o uso do pneu radial, da suspensão a ar, transmissão automática, direção hidráulica, motor (traseiro ou central) com potência mínima de 200 CV, dotado com equipamentos para diminuir os índices de poluição e ruídos, iluminação e ventilação adequada a passageiros e motoristas. Quanto as dimensões, o veículo Padron deveria ter um comprimento de 12 m, altura de 3,30 m e largura de 2,60 m. A altura entre o solo e o primeiro degrau de acesso deveria ser, no máximo, de 0,37 m e as portas com largura mínima de 1,10 m.

Depois de estipuladas as regras, novos produtos adequados surgiram para a modernização das frotas.
Foto - Memória Marcopolo

A dobradinha Scania e Ciferal compartilhou a premissa de que um ônibus urbano necessitava ser construído com características diferenciadas, próprias para oferecer uma série de comodidades a quem mais necessitava nos longos deslocamentos diários entre trabalho, residência, escola e divertimento. A Scania ainda lançou a idéia que o ônibus era o caminho certo para a racionalização do transporte de massa, com a função de transportar pessoas, implicando para isso em projeto com exigências específicas. Sua presença no projeto Padron foi com o modelo BR112 (mais tarde K112), um chassi com propriedades modernas inclusas em seus veículos europeus. A estrutura autoportante era o atrativo do BR 112, pois a independência dos módulos dianteiro e traseiro permitia a redução da altura dos degraus de acesso e do piso do salão de passageiros, além de possibilitar a instalação de portas mais largas na carroçaria e um layout interno a escolha do cliente. O protótipo do chassi estava equipado com suspensão pneumática, motor D11 aspirado com 203 CV (opcional DS11 turbo de 296 CV) montado transversalmente na traseira, caixa de transmissão automática com 6 velocidades da própria Scania (modelo GAV 762), freios a ar e direção hidráulica.

Arquivo Volvo

Para a Volvo, que então participou do projeto com dois chassis B58, não houve a necessidade de promover grandes modificações em seu chassi, pois o produzia dentro dos mais modernos parâmetros europeus e que podiam tranquilamente ser adotados no projeto. O B58 era equipado com um motor horizontal de 260 CV, que liberava o salão de passageiros de qualquer tipo de obstáculos, permitindo um layout a livre escolha do cliente, proporcionando a instalação de amplas portas de acesso. A suspensão pneumática, com controle automático de nível e a caixa de câmbio automática completavam os pontos modernos no chassi Volvo. Em princípios dos anos 70, a montadora, em sua pesquisa de mercado para a instalação de uma unidade industrial em terras brasileiras, já preconizava que o país necessitava modernizar o seu sistema de transporte público. Era de suma importância a racionalização do uso de meios de locomoção nas áreas centrais dos grandes centros urbanos, pois o crescimento populacional apresentava um expressivo aumento. E nisso, o ônibus teria seu importante papel na cadeia do transporte. “Esse projeto foi o divisor de águas entre os chassis de caminhões e um produto específico em ônibus. E o B58 mostrou ao mercado todo um conceito necessário em termos de operação, conforto e segurança para o transporte urbano”, lembrou Juarez Fioravante, ex-engenheiro de ônibus da Volvo do Brasil.

Diferentemente das duas marcas suecas, com seus modelos de chassis prontos para serem produzidos por aqui, a alemã Mercedes Benz trouxe de sua matriz duas unidades do chassi O305 equipado com motor OM 360, seis cilindros e 190 HP, portando ainda a transmissão automática desenvolvida por ela própria. Ela não seguiu adiante com esse modelo, disponibilizando ao mercado um outro veículo adequado aos padrões brasileiros.

Apresentação pelo Brasil do que poderia ser um avançado projeto para a melhoria dos veículos.
Foto - Museu virtual Carris Porto-Alegrense

A lição tirada pelo projeto Padron foi benéfica, pois promoveu alterações aos modelos de carroçarias mais simples, especificando quesitos mínimos e essenciais a uma melhora do ônibus urbano. Os parâmetros completos do projeto foram empregados em alguns sistemas de ônibus no Brasil, mas não com presença massiva, em função da praticidade do setor em adotar veículos com menores índices de sofisticação, tanto em chassis, como nas carroçarias e também pela difusão de regras criadas, no decorrer dos anos, para atender as peculiaridades de cada região brasileira, inerentes a um país com sua dimensão continental. Essa tentativa de normatização das carroçarias poderia ter colocado o Brasil em um patamar elevado quanto ao tipo de ônibus utilizado nos sistemas urbanos, mas ficou somente numa proposta bem intencionada.
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Obs - Este artigo foi republicado com acréscimos.

6 comentários:

  1. O projeto Padron precisa ser reconstruído. Várias cidades brasileiras estão retornando aquela época maldita em tecnologia veicular, destacando BH e Grande Vitória.

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  2. O Projeto Padron tem que ser revisto já...e no Rio a luta vai ser dura...rs...fora cabritada OF/OD.

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  3. Concordo com o Giancarlo, a Grande BH está precisando de ajuda, os cabritos estão por toda parte, projeto padron já!

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  4. Em BH é só PADRON que pode entrar no sistema a partir de 2008.

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  5. BH cidade do cabrito , q vergonha!!!
    Quero voltar no tempo!

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